Aposto que chegou nesse blog por
um acesso de desespero, solidão, histeria ou choro. É meus amigos, compreender
a Análise do Discurso em sua singularidade não é fácil pra um graduando ou pós-graduando
em Letras que mal tem conseguido devorar as dicotomias de Ferdinand de
Saussure. A Linguística não estaciona no mestre genebrino, ele apenas dá o
pontapé inicial para a ciência dos signos se fortalecer e ganhar
cientificidade. Mas não parou aí. Diante da Análise do Discurso, a proposta de
Saussure parece murchar. Mas muitos acadêmicos não têm essa visão geral do que
veio após esse período. E acreditem, também já estive na pele de vocês.
Sofrendo horrivelmente pela minha dificuldade em compreender o que é essa tal
Análise do Discurso e o que tem a ver com a ciência Linguística. Não é fácil
compreender logo à primeira vista. E se deram a você o livro Análise Automática
do Discurso de Pêcheux ou a Arqueologia do Saber de Foucault para que engulam,
simplesmente parem. Mesmo Introdução à Análise do Discurso de EniOrlandi não me
parece o texto mais adequado para navegar pelos mares da AD. Venham comigo,
talvez assim, consiga compreender em meus textos o que essa disciplina exige de
você como pesquisador.
Minha proposta é trazer os
principais postulados da Análise do Discurso de maneira leve, descomprometida
com uma linguagem de difícil acesso e que você realmente possa entender o que
essa disciplina apregoa. Os estudos discursivos realmente não são tarefas
fáceis, mas compreendendo a teoria você vai chegar lá. Vai entender o que é
interdiscurso, formação discursiva, memória discursiva, função enunciativa,
formação ideológica, entre outros conceitos que permeiam aquela que vou revelar
agora, não é só uma, mas várias modalidades de Análise do Discurso. Dependendo
da forma como você observa a linguagem, você quem diz se quer se inscrever em
qual das variadas modalidades existentes.
Pronto? Vamos lá?
A Análise do Discurso é uma
disciplina que nasce a partir de Harris e posteriormente de Pêcheux. Como esse
é um texto inicial, e diversos outros constituirão esse blog, saiba
aguardá-los. O que você precisa saber bem, é guardar esses nomes inicialmente.
Mas vamos viajar um pouquinho, acordar novamente Saussure que dormiu no segundo
parágrafo deste texto.
É preciso lembrar da ciência
linguística levantada por Saussure. Lembra-se da langue/parole, sincronia/diacronia, significante/significado, sintagma/paradigma,
entre outras dicotomias que marcaram o trabalho de Saussure? (ou de seus
herdeiros, já que na verdade o curso de Linguística Geral é um apanhado de
textos atribuídos ao mestre genebrino). Pois bem, nosso querido Ferdinand
pensou numa língua como um sistema fechado, uma estrutura em que a falta de um
ou o nascimento de um novo elemento não afetariam o sistema geral. Imaginemos
um quebra-cabeça muito grande que seria impossível para um indivíduo sozinho
montar todas essas peças. Assim, era a língua para Saussure. Jamais o homem
conseguiria dominar todas as palavras da língua, como também jamais aquele
indivíduo montaria o quebra-cabeça. Caso uma peça desse quebra-cabeça venha a
se perder, ainda será possível tentar montá-lo, o que aconteceria também com a
língua, caso uma palavra se transforme ou mesmo caia em desuso, não afetaria em
quase nada a grande estrutura que é a língua. E a questão do significado das
palavras é um processo bastante simples (e criticado posteriormente!): segundo
Saussure, o signo linguístico vale pelo que os outros não são. Como assim,
produção? Vamos pensar no quebra-cabeça. O que singulariza determinada peça do
quebra-cabeça? O simples fato de não ser outra peça. O desenho dessa peça não é
semelhante ao desenho das demais peças, o desenho das demais peças não é igual
ao desenho dessa peça em específico que falamos. Então, Saussure pensava que
“vaca” vale pelo o que “boi”, “bezerro”, “cabra” não consegue esgotar em seu
significado. Visto desse ângulo, parece tão simples quanto sua prova de Latim,
não? Mas, aí que mora o perigo.
As questões relativas ao
significado das palavras não são tão simples assim. E vários pesquisadores nos
momentos seguintes a Saussure se debruçaram para estudar tal fenômeno. Mikail
Bakhtin foi um dos primeiros a pensar sobre isso. Para ele, as palavras tem sua
significância validada pelo sistema, mas sim vai variar de acordo com a pessoa
que emprega. Não entendeu? Ele está deslocando os estudos dos signos para o
campo das práticas sociais. Ou seja, a ideia de Bakhtin é juntar você árduo
estudante de Letras ao pensamento de um estudante de ciências sociais. Explico.
Tomemos a palavra terra. Para Saussure, “terra” vale por aquilo que, por
exemplo, “latifúndio” não vale. Mas imaginemos essa palavra sendo proferida por
um latifundiário, dono de uma imensidão de propriedades no interior do Pará.
Agora, pensemos nessa mesma palavra sendo proferida por um individuo sem-terra.
Bingo. A mesma palavra terá sentidos distintos nas formulações linguísticas
desses sujeitos. Então as relações de sentido não terminam nas redondezas do sistema,
mas são apreendidas pelas práticas sociais de linguagem.
Pensando assim, fica fácil
compreender o nascimento de uma Análise do Discurso. É justamente esse pensar
que as palavras podem tomar diferentes sentidos dependendo dos sujeitos que as
empreguem, da situação de enunciação, do contexto social, político, econômico
de uma sociedade em um determinado tempo. Esses fatores juntos singularizam o
“Tchau, querida” que Dilma recebeu dos parlamentares que votaram por seu impeachement do “Tchau, querida” que você
deu a sua prima ontem no facebook. Apesar de ser a mesma formulação
linguística, o “Tchau, querida” de Dilma guarda uma espessura histórica que
explica sua aparição. Isso significa crer que nenhuma palavra aparece por acaso
porque estava no sistema e o indivíduo decidiu usá-la. É
bem mais complexo e esse nó problemático que a Análise do Discurso em suas
aventuras deseja desatar. Está preparado para isso? Então acompanhe nossos
textos. Ainda temos muito o que compreender desse complexo mundo da linguagem.
Até mais. E Tchau, queridos!
Por Max Marques
Por Max Marques